segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Mantenha Desligado o Celular!

Algumas repartições públicas, igrejas e outros lugares têm adotado a prática de restringir o uso de telefones celulares. Vivi 40 anos sem telefone celular. Os últimos 13 anos me levaram a uma pergunta cheia de perplexidade: como sobrevivi 40 anos sem telefone celular?
É verdade que muita gente fala no celular a todo momento (acho até que "naqueles momentos"). Mas a restrição ao uso de celulares precisa ter limites. Muitas vezes pessoas que se reúnem comigo, na Procuradoria da República, ficam bastante constrangidas quando toca o celular. Advogados ensaiam um não atendimento. Mas eu lhes digo que não me importo e que eles podem perder o cliente se não o atenderem. E, quando atendem, não vejo qualquer desrespeito nisso.
Uma criança perturba muito mais uma audiência judicial ou do Ministério Público ou da Polícia, ou mesmo uma cerimônia religiosa, do que um toque de celular. E tem gente que leva crianças para as audiências (evidentemente que não me refiro às audiências que dizem respeito à situação das crianças, onde estas devem estar presentes).
Eu, nas audiências judiciais, nunca desligo o celular. Já tive que atender para receber informações importantíssimas para aquela audiência.
Não creio que um atendimento discreto, precedido de um toque silencioso (vibração) vá perturbar um ato judicial ou uma cerimônia religiosa. Pode ser caso de um atendimento urgente, cujo não atendimento traga consequências indesejadas.
Resta conjecturar se Deus aprova ou não o celular. Isto, porém, sempre admite interpretações. Um episódio ocorrido há muito tempo, me faz pensar até hoje. Armando era Ministro da Eucaristia e estava distribuindo a comunhão. Seu filho, na fila para receber o sacramento, teve uma convulsão. Armando ficou entre segurar o cálice ou atender seu filho. Optou pelo cálice. Outras pessoas acudiram o filho de Armando. Depois ele colocou o cálice no altar e foi atender seu filho. Teria Deus ficado satisfeito com a atitude de Armando? Pode ser que sim, pode ser que não. É que, um ano depois, Armando estava sozinho em casa com seu filho e este teve nova convulsão. Teve que atendê-lo nos primeiros socorros, até chegar alguém. Teria Deus dado uma segunda oportunidade a Armando para ele socorrer seu filho com toda a dedicação? Ou Deus teria reprovado a atitude de Armando, criando uma situação em que ele foi obrigado a atender seu filho? Só Deus sabe...
De qualquer modo, melhor é pensarmos na vida terrena. Um toque de celular não atendido, pode ser um pedido de socorro ou outro tipo de urgência. Quem obriga a mantê-lo desligado, deve assumir os riscos do não atendimento.
Há, é claro, situações em que o uso de celular permite fraudes ou crimes: cola em prova, avisos para roubos e furtos etc. Mas há os arroubos de autoritarismo, que são aquelas situções em que é abusiva a proibição do uso de celular. Nestas situações vale lembrar que só foi punido o uso de celular em presídios após lei; antes  da lei foi dito que nada se podia fazer. Então, diante de abusos na proibição de celular, vale lembrar o art. 5º, II da Constituição: Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Faltou energia elétrica em Jurerê

Faltou energia elétrica em Jurerê Internacional. Tentei ver na internet, via Google, achar alguma notícia. Nada. Liguei para a CELESC. Nada consegui saber sem antes fornecer o número da unidade consumidora, endereço etc. Pois bem. Depois de tudo informado, a moça disse que está faltando energia em várias ruas, que a CELESC está ciente do problema, mas não tem previsão de quando haverá o restabelecimento da eletricidade. Assim, como nenhum órgão de comunicação informou, fica informado.
O fornecimento de energia elétrica foi restabelecido por volta das 12 h do dia 30.1.11.

Noida

Cacho de banana nascido sem ser semeado e sem defensivos agrícolas (agrotóxicos)
Um cacho de banana nasceu na bananeira que fica no terreno do vizinho, nos galhos que pendiam para o meu terreno. O jardineiro logo me disse que a banana me pertencia. Perguntei-lhe se tinha certeza e ele me disse que sim. Perguntei-lhe como sabia e ele disse que isso era o correto. Fiquei pensando se certas regras, de tão antigas, acabam se impregnando na cabeça das pessoas ou se estas regras foram feitas segundo os costumes. O fato é que assim está no Código Civil:

Seção II
Das Árvores Limítrofes

Art. 1.282. A árvore, cujo tronco estiver na linha divisória, presume-se pertencer em comum aos donos dos prédios confinantes.

Art. 1.283. As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do prédio, poderão ser cortados, até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido.

Art. 1.284. Os frutos caídos de árvore do terreno vizinho pertencem ao dono do solo onde caíram, se este for de propriedade particular.

E ele cortou o cacho de banana.
Cortado o cacho, o que fazer com ele?
Lembrei-me que, quando criança, os cachos de banana ficavam pendurados sob um telheiro, na parte de fora da casa, mas dentro do terreno. De vez em quando, um vizinho ou um hóspede davam cabo do cacho todo. Mas em regra as bananas eram consumidas só pela família.
Agora, as casas nem têm um lugar para pendurar o cacho. Então resolvi separar as bananas em pencas. Mas, para isso, existe uma faquinha curva, que eu não tinha. Então, corta-se com uma faca qualquer. O cacho, ou o caule do cacho, porém, solta uma resina, a "noida" que eu ouvia falar em Itajaí na década de 60 e ainda hoje ouço gente falando em Blumenau e em Florianópolis. Mas "noida" não existe no dicionário. Creio que "noida" é nódoa, palavra que o Aurélio dá um sentido que parece combinar com o que imagino seja a "noida", ou seja, uma mancha. Mas já ouvi dizerem que a resina "dá noida", e também que "é noida". O fato é que é o caule do cacho de banana solta uma resina pegajosa, que mancha a roupa, a faca e é difícil de tirar da mão.
Pensei, então, na dura vida do agricultor. Gente que tem uma vida trabalhosa e que nem sempre foi agraciada com o devido reconhecimento. Pior: aos camponeses foram dados nomes pejorativos. Vilão, por morar nas vilas, em oposição aos nobres que moravam nas cidades; peão (por andar à pé), em oposição aos cavaleiros que, por terem e montarem cavalos, podiam fazer a defesa do Rei; pagãos, por morarem nos "pagos", ou seja, nos campos. E ainda hoje, na legislação, se diz que membros da Magistratura devem tratar os membros do Ministério Público com urbanidade e os membros do Ministério Público da União devem tratar a todos com urbanidade, ou seja, com modos urbanos, da cidade. Daí se conclui que o comportamento ideal para Juízes e membros do Ministério Público é o urbano e o comportamento condenado é o rural.
Ou seja, o tratamento que a sociedade dá ao rurícula ainda é uma "noida" desta sociedade...

sábado, 29 de janeiro de 2011

Formigas antenadas

  
Outro dia andei vendo um documentário sobre comunicação entre formigas. Achei interessante, mas um episódio posterior deixou-me mais boquiaberto ainda.
Desde antes da era do microondas, minha mãe me disse que uma tia, que morava no Rio da Janeiro, adotava uma prática muito útil para quem não deseja comprar pão todos os dias: se compra certa quantidade do produto e se congela por até 4 meses (no congelador é por uns 10 dias; no "frizer" é que pode ser por 4 meses). Depois, na hora do café, se aquece e ele fica com gosto e aparência de novo. Com o aparecimento do forno de microondas, descobri que o aquecimento produz melhores resultados se feito no forno a gás ou no elétrico. No microondas o pão não fica torradinho, mas o processo também dá resultados práticos.
Pois uma manhã, ao tirar o cestinho de pão, ainda vazio, de cima do forno elétrico, que já estava aquecido, vi uma 50 formigas (daquelas bem pequenininhas) em pânico. Fiquei olhando um tempo, vendo o alvoroço, cuja causa supus que fosse o esquecimento do caminho de volta para a mesa (o forno tem 4 suportes pequenos e era por eles que passava a rota de fuga das formigas).
Mas, se havia umas 50 formigas girando em desespero com o calor que fazia na parte de cima do forninho, outras tantas já estavam nas laterais. Por ter visto o documentário sobre a comunicação entre as formigas, supus que estas outras, que andavam pelas laterais, procuravam a rota de fuga. E algumas, de fato, já estavam próximas de um dos 4 suportes do forno.
Fui pegar o pão no congelador. Ao voltar, havia apenas um cadáver de formiga em cima do forno (que tanto poderia ter morrido queimado, quanto pode ter sido a causa da subida das outras ao forninho). Todas as demais formigas fugiram, certamente após receberem comunicação sobre o caminho de volta.  

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Penas para os Nobres e para os Plebeus

A população da então colônia portuguesa conviveu,  por trezentos e trinta anos, com o sistema punitivo das Ordenações.
Este sistema, em geral, não previa a prisão como pena. O acusado permanecia preso até a sentença (1), quando então era executada a pena. As penas eram aplicadas, em regra, segundo os privilégios ou linhagem dos acusados. Assim, por exemplo, Fidalgos, Vereadores, Juízes e outros exaustivamente listados nas Ordenações, não poderiam sofrer pena de açoites, ou degredo com baraço e pregão (2). Estas penas, consideradas vis (ALMEIDA, 1870:1.315), eram aplicadas indistintamente nos crimes de Lesa Majestade, sodomia, testemunho falso e outros (3). Também não poderiam, os privilegiados, sofrer tormento (tortura), salvo se fossem acusados de crime de Lesa Majestade, aleivosia, furto e outros. Note-se que o tormento não era pena, mas sim meio de prova, “diligência", que deveria ser realizada formalmente (ALMEIDA, 1870: 1.308-1.310). 
Enfim, o sistema punitivo das Ordenações só em raríssimos casos cominava a pena de prisão e, mesmo assim, por tempo nunca superior a quatro meses (4). 
Ressalte-se, também, que a regra geral era que somente a classe dos peões suportava todos os tipos de penas, reservando-se para as pessoas então ditas de "maior qualidade" as penas de degredo, morte etc.
Tais pessoas ficavam, portanto, livres das denominadas penas vis(5).
De qualquer modo, tratava-se de um universo de penas em que a esmagadora maioria eram corporais ou infamantes.

Notas:
1 - PORTUGAL. Ordenações Filipinas (Livro Quinto, Titulo CXVII, §§ 12 a 19 e Título CXXII). 

2 - Segundo as Ordenações Filipinas (Livro Quinto, Título CXXXVIII) não podiam, em regra, sofrer a aplicação das penas vis os Escudeiros dos Prelados e dos Fidalgos, os moços da Estrebaria do Rei, da Rainha, do Príncipe, Infantes, Duques, Mestres, Marqueses, Prelados, Condes e de Conselheiros; os Pagens de Fidalgos, os Juízes, Vereadores e respectivos filhos, os Procuradores das Vilas ou Concelhos (sic), os Mestres e Pilotos de Navios, os amos ou colaços dos Desembargadores ou de Cavaleiros de linhagem. Ainda no Livro 5º, Título CXX, há disposição proibindo que sejam presos em ferros os Doutores em Leis ou em cânones, ou em Medicina, feitos em Universidade, os Cavaleiros Fidalgos, de Ordens Militares de Cristo, Santiago e Aviz, os Escrivães da Fazenda e Câmara reais, bem como as respectivas mulheres enquanto casadas ou mesmo já viúvas.

3 - PORTUGAL. Ordenações Filipinas (Livro Quinto, Tit. CXXXVIII, § 2º).

4 - PORTUGAL. Ordenações Filipinas. (Livro Quinto, Tit. CXXXIX).

5 - Segundo Pereira de Souza (apud ALMEIDA, 1870: 1.315) eram consideradas penas vis a forca, as galés, o cortamento de membro, os açoites, a marca nas costas, o baraço e o pregão. 

Bibliografia:

ALMEIDA, Cândido Mendes de. CÓDIGO PHILIPINO, OU ORDENAÇÕES E LEIS DO REINO DE PORTUGAL; Rio de Janeiro, 1870. Edição por reprodução em "fac-simile" da Fundação Calouste Gulbenkian, LISBOA, 1985.


quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Enchente em Jurerê 5

Conforme suas posses e o lugar onde vai morar, cada um pode assumir seus riscos. Uns assumem riscos por morarem em encostas, perto de barrancos etc. Dentro do nosso espírito de coitadismo, logo se argumenta que o coitado não tinha outro lugar para morar e teve que se instalar na área de risco. Mas nem sempre a pobreza é a causa da opção pelo risco.
Da mesma forma que há criminosos entre os pobres, há também entre os ricos. E da mesma forma que pobres optam pela área de risco, os ricos também podem optar. Os pobres perdem tudo porque a casa foi levada pelo desmoronamento. Os ricos correm riscos porque fizeram a garagem subterrânea, que encheu de água. Na foto acima, geladeira, cama e outros móveis perdidos porque a garagem subterrânea encheu de água, como tantas outras em Jurerê. Evidentemente que o prejuízo, proporcionalmente, é bem menor e bem menos sentido do que quem perde uma casa levada pelo morro que caiu...
Como se vê, também, pobres e ricos jogam entulho no mato...

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Enchente em Jurerê 4

A enchente em Jurerê Internacional fez algumas pessoas ulularem de espanto ou de outros sentimentos menos nobres. Não sei se é assim em outros países, mas, no Brasil, há uma antipatia com os ricos. Não se acredita que alguém possa ter ficado rico honestamente. Com certeza, se associa riqueza com pecado e pobreza com santidade. Donde ficarmos tanto tempo como um país pobre. 
Em 1986, na pesquisa que fiz para minha dissertação de mestrado, esta desconfiança para com os ricos ficou comprovada, para o universo de pesquisa, que assim respondeu: