1 de agosto de 2009, 19:30, Florianópolis: vou a um um casamento e encosto o carro na rua junto à Praça dos Bombeiros; sou acossado por um bando de homens pedindo dinheiro para que meu fique estacionado na via pública. Os primeiros que aparecem me "pedem" 15 reais; entrego o dinheiro pedido, pois meu carro ficaria ali, num lugar sem policiamento, enquanto eu iria a uma cerimônia de casamento. Volto ao carro para pegar algo que havia esquecido e outro homem, que havia chegado aos gritos, me "pede" mais 10 reais, dizendo que ia cuidar do carro e não iria fumar tudo em crack, como os que já me haviam levado 15 reais.
Hoje, saio de uma padaria, e uma mulher me pede dinheiro. Não dou. Entro no carro, ligo a chave e o motor não pega. Telefono para a seguradora, mas o socorro chegará em 1 hora. Fico esperando, e vejo que aparece o companheiro da mulher que me pediu dinheiro e fica ajudando-a a pedir dinheiro para outras pessoas que vieram comprar pão. Volto para o carro, tento ligar o motor de novo e "pega". Vou embora, antes cancelando o pedido de socorro à seguradora.
O Flanelinha é um pedinte, pois não presta serviço algum, apenas pede dinheiro. Qualquer um sabe que não é prudente negar dinheiro a alguém que ficará sozinho com nosso bem, ou seja, o carro. Como está implícita a ameaça de causar dano ao carro; como, às vezes, o estar sozinho ou com a esposa, a ameaça implícita é de agressão física; como a ameaça de dano é, às vezes, explícita, poderia se caracterizar o crime de extorsão (Código Penal, art. 158); mas o flanelinha também, ainda que não se declare, assume a função pública de guarda de trânsito, ou seja, ele se apodera do local público e, mediante cobrança, "organiza" o estacionanamento. Isto pode caracterizar também a usurpação de função pública (Código Penal, art. 328). E, se em mais de três pessoas, haverá caracterização do crime de quadrilha (Código Penal, art. 288). Mas, para as duas hipóteses de crime (CP, artigos 158 e 328) surgirão argumentos declarando que faltou este ou aquele elemento para caracterizar o crime. Mas defendo que é possível a caracterização.
Entretanto, ainda que se caracterize algum dos dois crimes, surge o princípio de insignificância, ou tolerância dez mil: o Judiciário (ou mesmo o Ministério Público) pode dizer que, se o flanelinha pediu só 15 reais, isto é muito menos do que dez mil reais, e ficará caracterizada a bagatela. E a impunidade.
Mas o fato pode caracterizar improbidade administrativa: quem distribui o policiamento em um local e sabe que, sem policiais, surgirão flanelinhas, que usam o patrimônio público para ganhar dinheiro, pratica o ato de improbidade do art. 10, II da Lei 8.429/1992. E pratica ato de improbidade porque não destinou e organizou no local devido e sob risco conhecido, uma força policial que inibisse a ação daqueles que usam o patrimônio público (a rua) para ganhar (extorquir) dinheiro dos que, legalmente, pretendem usar tal espaço para estacionarem seus carros.
Um esclarecimento: tanto a denúncia de flanelinhas, quando a propositura de Ação de Improbidade Administrativa contra quem não organiza o policiamento de modo a evitar os flanelinhas, não é atribuição do Minitério Público Federal, mas sim do Ministério Públido dos Estados.
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