terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

O Código Criminal do Império

O advento do Código Criminal do Império de 1830 (veja a íntegra do Código aqui) vai significar, no então nascente Império do Brasil, uma quase radical ruptura no sistema punitivo até então vigente.
O novo diploma legislativo definiu 211 crimes (1). Destes, 187 (88,62%) têm cominada pena de prisão, perda de emprego público, suspensão de emprego público, multa, ou, às vezes, duas ou mais destas penas cumuladas. E aos outros 24 crimes (11,37%)  são cominadas penas de morte, galés, desterro ou degredo. Esta contagem de crimes e penas vale para os libertos. Em se tratando de escravos, as penas são as mesmas dos libertos em se tratando de punição com morte ou galés. Nos demais casos, há substituição por açoites (2), em quantidade a ser fixada pelo juiz (3). Considerada esta substituição, os escravos podiam ser açoitados se praticassem 152 (72,03%) dos 211 crimes existentes no Código Criminal. Isto porque não podiam praticar os 44 crimes típicos de empregados públicos, já que a tais cargos não tinham acesso, visto serem considerados bens (4). E, ademais, apesar da abolição constitucional da pena de açoites (5), a permanência da escravidão se respaldava na garantia constitucional da propriedade (6).

Notas:
1 - É difícil fazer uma contagem exata dos crimes e penas, porque o Código comina penas distintas para crime consumado e tentado, autoria e cumplicidade, reincidência, ausência ou presença de qualificadoras, dolo e culpa, para o caso de haver e para o caso de não haver no lugar da condenação casa de correção em que possa ser cumprida a pena de prisão com trabalho.

2 - BRASIL. Código Criminal do Império do Brasil, artigo 60.

3 - O artigo 33 do Código Criminal do Império abria a possibilidade de, em alguns casos, o Juiz fixar a pena arbitrariamente. Um destes casos era o do artigo 60, deste mesmo Código, segundo o qual "Se o réu for escravo, e incorrer em pena que não seja a capital ou de galés, será condenado na de açoites, e, depois de os sofrer, será entregue a seu senhor, que se obrigará a trazê-lo com um ferro pelo tempo e maneira que o juiz designar." O número diário de açoites não podia ser maior do que 50. Mas o aviso de 10 de junho de 1861 declarou que este número poderia chegar a 200, sem perigo de vida para o condenado. Mas "em todos os casos deve ser ouvido o juízo médico." (PIERANGELLI, 1980:200).

4 - No Aviso nº 388, de 21.12.1855 (ALMEIDA, 1870:1071-1077), dá-se como fundamento da escravidão, no Brasil Imperial, o direito à propriedade previsto no artigo 179, XXII da Constituição de 1824. Sendo o escravo um bem, não ficaria protegido pela proibição de açoites, tortura, marca de ferro quente e outras penas cruéis, prevista no artigo 179, XIX, da referida Constituição.

5 - BRASIL. Constituição de 25 de março de 1824, art. 179, XIX.

6 - Vide nota 4, supra.


Bibliografia:

ALMEIDA, Cândido Mendes de. CÓDIGO PHILIPINO, OU ORDENAÇÕES E LEIS DO REINO DE PORTUGAL; Rio de Janeiro, 1870. Edição por reprodução em "fac-simile" da Fundação Calouste Gulbenkian, LISBOA, 1985.

PIERANGELLI, José Henrique. CÓDIGOS PENAIS DO BRASIL - EVOLUÇÃO HISTÓRICA. Bauru:Jalovi, 1980.

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