domingo, 23 de outubro de 2011

CONCEITO DE PODER CONSTITUINTE


   Pela sua objetividade e obviedade, convém reproduzir o conceito de FERREIRA (1) para poder constituinte: O poder constituinte é o poder de elaborar uma Constituição. É um conceito de desconcertante neutralidade, mas que, com alguma reflexão, se percebe ser de grande realismo. Vejamos o próprio FERREIRA, ao explicitar seu conceito: É a expressão da vontade suprema do povo social e juridicamente organizado. Ou o conceito de CANOTILHO (2): é a soberania constituinte do povo. Tanto na segunda acepção de FERREIRA quanto na de CANOTILHO, a linguagem deixa de ser descritiva para ser prescritiva. Por que isto? Ora, independentemente de quem elabora, uma Constituição que entre num sistema jurídico pela força de uma ditadura ou pela juridicidade de uma eleição universal e democrática, será uma Constituição, ou pelo menos ter-se-á que aceitá-la como uma constituição. Vejamos nossa realidade histórica: 
  • a primeira constituição brasileira, ou seja, a Imperial, de 25.03.1824, foi elaborada pelo imperador D. Pedro I;
  • a Constituição de 1891 foi convocada por Decreto do Presidente que tomara o poder pela força [Deodoro da Fonseca, após proclamação da República - Decreto nº 1, de 15.11.1889 e Decreto nº 78B, de 21.12.1889 – nestes mesmos decretos, foram considerados eleitores os cidadãos alfabetizados,  mas o eleitorado correspondia a 5,5% da população (3)];
  • o mesmo aconteceu com a constituinte que elaborou a Constituição de 1934 (Decreto nº 21.402, de 14.05.1932), após a tomada do poder por Getúlio Vargas, em 1930 – o eleitorado correspondia a 13% da população);
  •  a Constituição de 1937 foi fruto de um novo golpe de Estado, em que Getúlio Vargas outorgou a carta e passou a exercer os três poderes; 
  • a constituinte que elaborou a Constituição de 1946 foi convocada pelo Presidente da República – apesar de o ato convocatório ter o nome de lei (Lei Constitucional nº 13, de 12.11.1945) – o eleitorado correspondia a 16% da população);
  • em 1966, pelo Ato Institucional nº 4, de 07.12.1966, houve a Convocação do Congresso Nacional para discussão, votação e promulgação do Projeto de Constituição apresentado pelo Presidente da República  [este congresso foi eleito por 25% da população (4)]; e
  • em 1969, os três ministros militares, que assumiram o poder em lugar do Vice-Presidente, praticamente refizeram a Constituição de 1967 autocraticamente. 
  • E, como acima já foi informado, a constituinte que elaborou a Constituição de 1988 foi convocada pelo Congresso Nacional  – EC nº 26, de 27.11.1985 e o eleitorado correspondia a 51,76% da população (5). 


   Com ou sem vontade, porém, todas estas cartas, independentemente de sua fonte e da legitimidade desta fonte, tiveram que ser chamadas de “Constituição” e tiveram que ser respeitadas como tal. Assim, mesmo sem legitimidade, mesmo que “tecnicamente”, ou historicamente, ou teoricamente, não pudesse ser chamado de “poder constituinte”, o fato é que, quem fez esses documentos jurídico-políticos, acabou gerando as diversas Constituições acima mencionadas. Donde a objetividade do conceito de FERREIRA, acima mencionado.

1 - FERREIRA, Luiz Pinto. Curso de Direito Constitucional. São Paulo, Saraiva, 12 ed., 2002, p. 18.
2 - CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra. Almedina, 7ª edição, 2003, p. 72.
3 - PAIVA, Maria Arair Pinto. Direito Político do sufrágio no Brasil (1822-1982). Brasília, Thesaurus Editora, 1985, p. 224.
4 - SEGATTO, José Antônio. O processo eleitoral. Folhetim, (Folha de São Paulo),  São Paulo, (417): p. 4-5, 13/01/1985.
5 - Segundo pesquisa realizada por Adelita Schirley Araujo dos ANJOS, a população do Brasil, em 1986, 134.016.375 habitantes (valor estimado) e o eleitorado compunha-se de 69.371.495 de pessoas.

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