Em 1975 participei de um Festival de Teatro de Estudantes de Arcozelo. Fomos em 10 rapazes adolescentes (16 anos na média) de Itajaí/SC para Vassouras/RJ. Numa Kombi. Viajamos direto, com uma parada de 4 horas na estrada para dormir. Hoje, com 52 anos, não sei se aguentaria.
Cada grupo de teatro (o nosso se chamava Folk) encenaria uma peça infantil. A nossa - que nós mesmos escrevemos - tratava de um menino que ganhava uma cesta de doces, os doces criavam vida e disputavam serem comidos pelo menino. Havia também uma barata que ameaçava atacar os doces.
Passamos uns 7 dias na Aldeia de Arcozelo. Havia uma boa quantidade de jovens atores, diretores, sonoplastas, enfim, esse povo que dá vida a uma peça de teatro. Era um infinidade de peças que se apresentavam, durante o dia e a noite. Havia palastres, mini-cursos etc. A abertura foi solene e estava presente Australgésilo de Athayde. Quem comandava a aldeia e o festival era Paschoal Carlos Magno.
Às vezes faltava água nos banheiros e, numa noite, um gaiato lambuzou de titica todo o banheiro masculino. Foi um escândalo. No dia seguinte, Paschoal nos reuniou no anfiteatro para uma admoestação coletiva. Das frases que disse, uma nunca esqueci: Quem fez isso não se realizou nem como homem, nem como mulher, nem como homossexual...
Depois da bronca, todos foram limpar o banheiro.
Chegou o dia de apresentarmos nossa peça. Pano aberto e começamos. Era uma peça infantil, mas nos maquiávamos naquele estilo dos Secos & Molhados, no auge então. Isso já deixou a platéia meio insatisfeita. Aí os doces iam saindo da cesta, todos rapazes (não havia mulheres no grupo - na época ainda eram ariscas para esta atividade, especialmente em Itajaí). O pirulito dizia: Me chupa, eu sou todo vermelhinho (e a platéia gargalhava). A maria-mole dizia: Me come, eu sou bem molinha, e a platéia ria mais ainda. E foi aí que começamos a nos dar conta de que a peça infantil - escrita por quase crianças - na verdade era carregada de erotismo. Mas a censura a tinha aprovado (havia censura na época - auge do regime militar).
A apresentação corria e a platéia rindo cada vez mais, até que Paschoal se levanta e grita: Parem a peça! Isso não é teatro infantil, é teatro de revista!
Darcy, o nosso Diretor, saiu dos bastidores, jogou a casaca listada que vestia no chão e soltou um palavrão.
Atônitos, paramos a peça.
Para nossa emoção, a platéia subiu ao palco e começou a gritar Folk, Folk, Folk... Abaixo o festival, abaixo o festival...
Saímos do Teatro e ficamos todos conversando. O festival terminaria dali a algumas horas. Seu término fora precipitado por falta de verbas ou algum outro motivo que não foi dito ou não lembro. Na época do regime militar as coisas eram assim: deviam acabar num dia, mas de repente acabavam, sem que se soubesse porque.
Como o festival acabou mais cedo, a Kombi, que voltara para Itajaí, nos deixou alguns dias na Aldeia à espera. Apresentamos uma outra peça de teatro para duas pessoas, pois todos os outros já tinham ido embora. A apresentação foi só para ocupar o tempo, pois ficamos sem nada para fazer naqueles dias.
Depois viemos embora.
O episódio ainda repercutiu uns meses em Santa Catarina, com acalorados debates no meio artístico, até o assunto cair no esquecimento.
João, boa tarde. Meu nome é Carolina Murad, sou assistente de direção e estou as voltas com a pesquisa so que será um documentário de longa metragem sobre a vida de Paschoal carlos Magno e os festivais de teatro de estudante principalmente s que aconteceram na Aldeia de Arcozelo.
ResponderExcluirQueria saber como é a melhor maneira de conversarmos sobre as suas lembranças dessa época.
Meu e-mail de contato: carolmurad@gmail.com
Não sei se respondi em 2014. Se não respondi, perdão. Ainda há interesse?
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