A Revolução Francesa acabou tendo alguma influência na independência do Brasil e na adoção, por aqui, ao Constitucionalismo.
É que Portugal, antigo aliado da Inglaterra, aderiu à primeira coalizão contra a Revolução Francesa, pelo tratado de Londres, de 26 de setembro de 1793, dela se retirando em 1796. A Espanha, que assinou armistício com a França em 1795, declarou guerra à Inglaterra e desejou que Portugal fizesse o mesmo. Portugal não aderiu à pretensão espanhola. Em 20 de agosto de 1797 fez um tratado de paz com a França, mas logo após o diretório francês teve o tratado por nulo. Ainda em 1797, Portugal se aliou com a Inglaterra para guerrear com a Espanha e, em 1799, auxiliou os ingleses em bloqueio às tropas de Napoleão Bonaparte. Em 1801 Portugal faz novo tratado de paz com a França. Na verdade, Portugal pendia para o lado da Inglaterra, mas procurava aparentar neutralidade na contenda desta com a França. Deste modo, não aderiu ao bloqueio continental que Napoleão Bonaparte decretara contra a Inglaterra. E a sequência dos fatos levou à invasão de Portugal pelas tropas francesas, sob o comando do General bonarpartista Junot. No dia 28 de novembro de 1807, Junot chegava a Portugal e a família real partia para o Brasil, sob a proteção da esquadra inglesa (1). Aqui ficou por 13 anos. Esta permanência criou o sentimento de independência no Brasil, forçando a mudanças paulatinas: elevação do Brasil de Estado para Reino, em 1815; revolução em Portugal em agosto-setembro de 1820, que levou ao retorno da família real, permanecendo o príncipe regente Dom Pedro (filho do Rei D. João VI) no Brasil; implantação do constitucionalismo em Portugal e independência do Brasil. Uma semelhança: a independência de Portugal do reino de Leão e Castela, em 1128, foi declarada pelo neto do rei de Leão e Castela (D. Afonso Henriques); a independência do Brasil foi proclamada pelo filho do rei de Portugal.
De se ponderar que não foram só os eventos que se seguiram à invasão de Portugal pelos franceses que levaram à independência do Brasil. Já no século XVIII se acentuava a dependência de Portugal para com o Brasil, de modo que a relação de ambos não era meramente o de um servo colonial e um senhor europeu. Desde a expulsão dos holandeses do nordeste brasileiro (que foi uma questão amplamente brasileira, apesar de seu objetivo ser o restabelecimento da soberania portuguesa no Brasil), os líderes portugueses mais astutos passaram a tratar os brasileiros com cuidado, com respeito conveniente e com cautela (2). Ademais, o Brasil não era a única opção para a fuga da família real portuguesa: havia também Angola, na época também colônia de Portugal. Ilustrativo desta relação Portugal-Brasil-Angola é o seguinte episódio:
Por volta de 1660 os comerciantes brasileiros começaram a enviar cachaça e tabaco para seus representantes comerciais na capital colonial de Angola, a fim de serem negociados no comércio de escravos (3), especialmente com o reino de Matamba. Em Angola a cachaça brasileira era conhecida por geribita. Por ser mais barata e com teor alcoólico mais alto, a geribita desbancou o vinho e o aguardente portugueses. Não tardou, portanto, que o comércio da cachaça fosse proibido, sob o argumento de que a bebida era nociva à saúde (1679). Desde a proibição, porém, não faltaram as tentativas para revogá-la. A cachaça brasileira, então, passou a ser contrabandeada para Angola. Em 1694, os conselhos municipais de Luanda peticionaram mais uma vez à Coroa, juntando atestado firmado por três médicos, no qual estes diziam que, afinal, a geribita não era tão prejudicial à saúde, desde que usada moderadamente. E, em 1695 a Coroa Portuguesa revogou a proibição.
Do que foi visto até aqui, pode-se concluir dizendo que os fundamentos históricos dos nossos comportamentos jurídicos, pode não só nos fazer distinguir constituições reais de constituições de papel (4), mas também ensinar-nos como elaborar constituições que efetivamente sejam vivenciadas por todos, posto que fruto da experiência jurídica coletiva.
Notas:
- 1.LIMA, Oliveira. Dom João VI no Brasil. Rio de Janeiro, Topbooks, 3ª edição, 1996, pp. 25-54.
- 2.MAXWELL, Kenneth. MARQUES DE POMBAL – PARADOXO DO ILUMINISMO. Tradução de Antônio de Pádua Danesi. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1996, pp. 172-173.
- 3.CURTO, José C. Vinho verso Cachaça: A Luta Luso-Brasileira pelo Comércio do Álcool e de Escravos em Luanda, c. 1648-1703. In Angola e Brasil nas Rotas do AtLântico Sul. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1999, pp. 73 a 95.
Nenhum comentário:
Postar um comentário