Para os protestantes, trabalho e a industriosidade são um dever para com Deus
Max WEBER, na obra A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo (Trad. M. Irene de Q. F. Szmrecsányi e Tamás J.M.K. Szmrecsányi, Livraria Pioneira Editora, SP., 4 ed., 1985, pp. 128-12) afirma que a ascese protestante aprofundou até o máximo o ponto de vista de que o trabalho consciente, mesmo por baixos salários, da parte daqueles a quem a vida não oferece outras oportunidades, é algo de sumamente agradável a Deus. Mas, ainda segundo WEBER, o aprofundamento de tal ponto de vista ocorreu porque a ascese protestante produziu uma norma, que sozinha, bastou para tornar eficiente este ponto de vista: a da sua sanção psicológica através da concepção do trabalho como vocação, como meio excelente, quando não único, de atingir a certeza da graça. Por outro lado, ela legalizou a exploração dessa específica vontade de trabalhar, com o que também interpretava como vocação a atividade do empresário. Não é difícil perceber quão poderosamente a procura do reino de Deus, apenas através do preenchimento do dever vocacional, e a estrita ascese imposta naturalmente pela Igreja, especialmente nas classes pobres, iria influenciar a produtividade do trabalho, no sentido capitalista da palavra. O tratamento do trabalho como vocação era tão característico para o moderno trabalhador, como a correspondente atitude aquisitiva do empresário. Foi a percepção dessa situação, então nova, que levou um observador anglicano tão arguto como Sir William Petty a atribuir o poderio holandês do século XVII ao fato de os numerosos dissenters (calvinistas e batistas) serem em sua maioria "pessoas que encaram o trabalho e a industríosidade como seu dever para com Deus”.
Para os católicos, o trabalho é realizado para ganhar o pão com o suor do rosto
Na Encíclica Laborem exercens, de 14.9.1981, o Papa João Paulo II vê o trabalho como forma do homem procurar o pão quotidiano e contribuir para o progresso contínuo das ciências e da técnica, e sobretudo para a incessante elevação cultural e moral da sociedade, na qual vive em comunidade com os próprios irmãos. Diz ainda o Pontífice, na referida encíclica, que Se é verdade que o homem se sustenta com o pão granjeado pelo trabalho das suas mãos (...) - então é igualmente verdade que ele se alimenta deste pão com o suor do rosto (...).
Na encíclica, se reconhece que (...) embora seja verdade que o homem está destinado e é chamado ao trabalho, contudo, antes de mais nada o trabalho é “para o homem” e não o homem “para o trabalho”. A finalidade do trabalho é o homem.
O documento papal de 1981 registra que o homem, depois de ter infringido a aliança original com Deus, ouviu estas palavras: ‘Comerás o pão com o suor da tua fronte’. E acrescenta que Tais palavras referem-se àquela fadiga, por vezes pesada, que a partir de então passou a acompanhar o trabalho humano. O trabalho se destina a fazer com que o homem submeta a terra. E é fatigante – insiste a Encíclica – fadiga que é um fato universalmente conhecido, porque universalmente experimentado.
Muito embora unido com a fadiga e o esforço – diz a Encíclica – o trabalho não cessa de ser um bem, de tal sorte que o homem se desenvolve mediante o amor pelo trabalho.
O documento Pontifício entende que não se podem separar o "capital" do trabalho e que de maneira nenhuma se pode contrapor o trabalho ao capital e o capital ao trabalho, e, menos ainda (...) se podem contrapor uns aos outros os homens concretos, que estão por detrás destes conceitos. E reconhece que o trabalho — nos diversos sentidos da palavra — é uma obrigação.
Disse, ainda, o Papa que O homem deve trabalhar, quer pelo fato de o Criador lh'o haver ordenado, quer pelo fato da sua mesma humanidade, cuja subsistência e desenvolvimento exigem o trabalho. O homem deve trabalhar por um motivo de consideração pelo próximo, especialmente consideração pela própria família, mas também pela sociedade de que faz parte, pela nação de que é filho ou filha, e pela inteira família humana de que é membro, sendo como é herdeiro do trabalho de gerações e, ao mesmo tempo, co-artífice do futuro daqueles que virão depois dele no suceder-se da história. Tudo isto, pois, constitui a obrigação moral do trabalho, entendido na sua acepção mais ampla.
Mas, a Laborem exercens insiste na questão da fadiga do trabalho e o relaciona com o pecado: "Todo o trabalho", seja ele manual ou intelectual, anda inevitavelmente conjunto "à fadiga". O Livro do Gênesis exprime isto mesmo de maneira verdadeiramente penetrante, ao contrapor àquela benção original do trabalho, contida no próprio mistério da Criação e ligada à elevação do homem como imagem de Deus, a "maldição" que o "pecado" trouxe consigo: "Maldita seja a terra por tua causa! Com trabalho penoso tirarás dela o alimento todos os dias da tua vida". Esta pena ligada ao trabalho indica o caminho da vida do homem sobre a terra e constitui "o anúncio da morte": " Comerás o pão com o suor da fronte, até que voltes à terra da qual foste tirado...".
E termina assim a Encíclica Papal:
No trabalho humano, o cristão encontra uma pequena parcela da cruz de Cristo e aceita-a com o mesmo espírito de redenção com que Cristo aceitou por nós a sua Cruz. E, graças à luz que, emanando da Ressurreição do mesmo Cristo, penetra dentro de nós, descobrimos sempre no trabalho um vislumbre da vida nova, do novo bem, um como que anúncio dos "céus novos e da nova terra", os quais são participados pelo homem e pelo mundo precisamente mediante o que há de penoso no trabalho. Mediante a fadiga e nunca sem ela. Ora tudo isto, por um lado, confirma ser indispensável a cruz numa espiritualidade do trabalho humano; por outro lado, porém, patenteia-se nesta cruz, no que nele há de penoso, um bem novo, o qual tem o seu princípio no mesmo trabalho: no trabalho entendido em profundidade e sob todos os aspectos, e jamais sem ele.
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