Em 1500, ano do Descobrimento do Brasil, Portugal era um Estado consolidado, uma monarquia hereditária absolutista. Possuía vasta legislação, compendiada nos cinco volumes das Ordenações Afonsinas, além das leis extravagantes. Pode-se dizer que as ordenações foram consolidando alguma coisa do Fuero Juzgo, dos forais, do Direito Canônico, do Direito Romano e dos Costumes. É verdade que nem sempre havia a incorporação do costume à lei, pois situações ocorreram em que a lei combatia o costume:
Foral de Tomar de 1174
[5º] Por merda em boca metuda em qualquer que o faça peite sesenta soldos. (Em português atual: [5º] O que puser esterco na boca de outrem, onde quer que se encontre pague sessenta soldos)”(1).
Esta disposição foi incorporada nas Constituições (= ordenações, leis) de Dom Afonso III, que reinou em Portugal de 1248-1279:
Constituição 99 da merda em boca: Estabelecido é que todo aquele ou aquela que meter a homem ou a mulher merda em boca que morra porém(2).
E, ainda, e nas Leis de Dom Dinis, que reinou de 1279-1325:
Que pena deve ter aquele que meter ou mandar meter merda em boca
Dom Dinis etc estabelecemos e pomos por lei que todo homem ou mulher que a outrem meter ou mandar meter merda em boca que morra porém.
Além da legislação escrita(3), havia uma organização Estatal que compreendia toda a organização judiciária (“A Justiça”) e a administrativa (“A Fazenda”)(4). A Justiça compunha-se de duas instâncias [Juízes (de Vintena, Ordinários e de Fora) e Desembargadores], além de ter outros ofícios (Tabeliães, Corregedores, Ouvidores, Meirinhos, Promotores da Justiça etc). Em última instância poderia haver recurso para o Rei. A Fazenda possuía todo um corpo de encarregados (Chanceleres, Almotacés, Escrivães, Tesoureiros, Vereadores, Quadrilheiros, Alcaides etc). Um dado curioso é que, apesar de, em muitas monarquias, o símbolo da assunção do poder pelo rei ser a coroação, em Portugal os reis nunca eram efetivamente coroados: eram levantados e aclamados(5).
A foto acima é da cidade de Óbidos, em Portugal (foto de 2007).
Notas:
1 - CONDE, Manuel Sílvio Alves. Os forais tomarenses de 1162 e 1174. Guimarães, Sociedade Martins Sarmento | Casa de Sarmento. Revista de Guimarães, n.º 106, 1996, pp. 193-249 - para ler mais, clique aqui.
2 - Ordenações Del-Rei Dom Duarte. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1988, p. 106 e 176.
3 - A legislação escrita compreendia os forais, que eram cartas de lei que o rei outorgava a uma Vila ou cidade como documento de sua fundação e nos quais constavam as normas que vigorariam naquela vila ou cidade e, ainda, as constituições, ou leis ou ordenações que valiam para todo o reino.
4 - Ordenações Filipinas (Primeiro Livro, Título 99: Porquanto por confiarmos de algumas pessoas, que nos serviram bem e fielmente, e como cumpre a nosso serviço e bem da Justiça, descargo de nossa consciência e proveito da nossa Fazenda, os encarregados de alguns Ofícios da Justiça, ou da nossa Fazenda, e assim por lhes fazermos mercê (a qual porém lhes não faríamos, posto que boa vontade lhes tenhamos, se não fosse a confiança, que neles temos),e depois de os assim termos encarregados nos tais Ofícios, vêm às vezes à nossa notícia que os não servem como são obrigados, e conforme a confiança, que neles tínhamos, quando dos tais Ofícios os provem.
5 - SOUZA, Marina de Mello e. Reis negros no Brasil escravista: história da festa de coroação de Rei Congo. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2002, p. 31.
Nenhum comentário:
Postar um comentário