quinta-feira, 8 de abril de 2010

Direito e Estado 2


O estudo da história do Direito, em regra, se limita ao Direito escrito. E isto ocorre não só por questões de praticidade, mas também porque é muito mais tranqüila a prova científica de regras escritas, do que das orais. Como provar uma regra jurídica oral, porventura observada entre os índios brasileiros Xokleng, no ano 1000 (1) d.C., por exemplo? Ou como conhecer as normas jurídicas do Congo, em 1482, que também não eram escritas [mas que existiam (2)]? Já no tocante às normas jurídicas escritas, hoje é possível ler partes das Leis de Eshnunna [1792-1750 a.C. (3)], do Código de Hamurábi [1728-1686 a.C. (4)], muitas leis romanas [a Lei das XII Tábuas data do ano de 451 a.C. (5)], o Código Visigótico (que vigorou na Península Ibérica a partir do reinado de Alarico II - 484-507) e, já na Idade Média, uma significativa quantidade de normas jurídicas. Mas um direito que tenha vigorado entre os povos sem escrita (ágrafos), torna-se difícil de ser conhecido, especialmente se este povo já se dispersou ou se extinguiu. De qualquer forma, isto quer dizer que nem é possível afirmar que “onde há sociedade há direito” ou que pode haver sociedade sem direito. São questões a serem estudadas. Ainda assim, os primeiros portugueses que chegaram ao Brasil diziam (em coro como os Europeus de então) que os índios eram um povo sem fé, sem lei, sem rei (ou seja: sem religião, sem Direito e sem Estado). Hoje discute-se se havia ou não uma organização Estatal ou algum esquema de poder entre os índios (veja-se, por exemplo, CLASTRES e CUNHA, citados nas notas de rodapé). Já entre os africanos (e aqui se enfatiza os povos que vieram como escravos para o Brasil), não se põe em dúvida a existência de organizações estatais (veja-se a obra de KI-ZERBO, por exemplo), organizações estas que, entre nós, por muito tempo foram rememoradas nas congadas (6).
Os objetos de arte africana da foto acima estão expostos no Museu Metropolitano de Nova Iorque.
Notas:
1 - Cálculo de tempo apresentado a partir de URBAN, Greg. A História da cultura brasileira segundo as línguas nativas. Tradução de Beatriz Perrone-Moisés. Em CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). HISTÓRIA DOS ÍNDIOS NO BRASIL. São Paulo, Companhia das Letras:Secretaria Municipal de Cultura:FAPESP, 2ª edição/1ª reimpressão, 2002, p. 91.
2 - Conforme KI-ZERBO, Joseph. História da África Negra. Tradução de Américo de Carvalho. Mem Martins (Portugal), Publicações Europa-América, 3ª Edição, 1999, pp.234-235.
3 - Há divergência entre as datas, conforme aponta o próprio tradutor BOUZON, Emanuel. As Leis de Eschnunna (1825-1787 a.C. ), Petrópolis, Vozes, 1981, p. 10.
4 - Conforme BOUZON E. O Código de Hamurábi. Petrópolis, Vozes, 1980, p. 10.
5 - Conforme nota de VIEIRA, Jair LoT. Código de Hamurábi, Código de Manu, Lei das XII Tábuas. EDIPRO, Bauru, 2ª edição, 2002, p. 123.
6 - Veja-se, sobre a Festa de Coroação de Rei Congo SOUZA, Marina de Mello e. Reis Negros No Brasil Escravista. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2002.

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