domingo, 30 de agosto de 2009

Prisão Resolve? (2)

A prisão, ou outra pena tem, segundo o artigo 59 do Código Penal, a finalidade de punir e servir de exemplo para que outros não cometam crimes. A pena é, portanto, um consequência desagradável e indesejada para o crime. Assim, imagina-se como pena aquilo que possa dissuadir alguém de cometer um crime. Os castigos corporais (açoites, cortes de membros etc) funcionaram melhor para dissuadir as pessoas de cometerem crimes? Não sei se há pesquisas científicas sobre isso, mas o fato é que este é o ponto: como implementar ameaças para o não cometimento de crimes.
A prisão é uma tentativa de punição, surgida no Século XIX [ver em "Prisão Resolve (1)?]". Tem funcionado? Em alguns casos sim, outros não.
No Brasil, dizer que o sistema prisional está falido é falta de visão histórica. Só vai à falência alguma coisa que funcionou. E, como vimos em "A Prisão Resolve? (1)", nosso sistema prisional funcionou mal desde o início.
E o que pensar do sistema punitivo das Ordenações, muito mais violento. Resolvia? Difícil responder, pois a diferença entre as épocas em que cada sistema funcionou é muito grande.

sábado, 29 de agosto de 2009

Prisão Resolve? (1)

Quando ouço pessoas ou leio opiniões sobre a pena de prisão, fica-me a impressão de se pensa que a pena de prisão foi algo que sempre existiu. Quando falo em pena de prisão, quero me referir ao tempo que alguém tem que passar preso, como punição a um crime, tempo este que se quer proporcional à gravidade do crime.

Acontece que a pena é uma forma recente de punir as pessoas.

A pena de prisão, como forma de punição de delitos, foi introduzida no mundo no século XIX (PACHUKANIS. A teoria geral do direito e o marxismo. Trad. Soveral Martins. Coimbra, Centelha, 1977, p. 236)

No Brasil, até 1830, o tempo que se passava numa prisão se destinava apenas a aguardar a pena definitiva. Os crimes e as penas constavam do Livro V das Ordenações Filipinas.

PRISÃO NAS ORDENAÇÕES FILIPINAS

As Ordenações Filipinas não previam a prisão como pena. O acusado permanecia preso até a sentença, quando então era executada a pena (Livro V, tít. CXVII, §§ 12 a 19 e tít. CXXII). Nos raros casos em que havia pena de prisão, esta nunca era superior a quatro meses (Livro V, tít. CXXXIX). As penas eram aplicadas segundo os privilégios ou linhagem dos executados (estes sofriam penas de degredo, morte etc) e os peões (aqueles que não eram cavaleiros) sofriam todos os tipos de penas. Assim, por exemplo, Fidalgos, Vereadores, Juízes e outros exaustivamente listados nas Ordenações, não poderiam sofrer pena de açoites, ou degredo com baraço e pregão, como consta no Livro V, tít. CXXXVIII. Mais detalhadamente: Escudeiros dos Prelados e dos Fidalgos, moços da Estrebaria do Rei, da Rainha, do Príncipe, Infantes, Duques, Mestres, Marqueses, Prelados, Condes e de Conselheiros, Pagens de Fidalgos, Juízes, Vereadores e respectivos filhos, Procuradores das Vilas ou Concelhos, Mestres e Pilotos de Navios, amos ou colaços dos Desembargadores ou de Cavaleiros de linhagem, não podiam sofrer a aplicação das penas vis. No Livro V, CXX, há disposição proibindo que sejam presos em ferros os Doutores em Leis ou Cânones, ou em Medicina, feitos em Universidade, os Cavaleiros Fidalgos, de Ordens Militares de Cristo, Santiago e Aviz, os Escrivães da Fazenda e Câmara reais, bem como as respectivas mulheres enquanto casadas ou mesmo já viúvas.
Havia, porém, alguns crimes cujas penas eram aplicadas indistintamente, sem qualquer ressalva quanto à qualificação do criminoso: lesa majestade, sodomia, testemunho falso e outros. O tormento (hoje, tortura) não era aplicado a todas as pessoas, salvo se fossem acusados de crime de lesa majestade, aleivosia, furto e outros. O tormento não era pena, mas sim meio de prova, após alguns indícios (confissão fora do Juízo, uma testemunha, fama pública etc; mas o julgador poderia decidir mediante outros indícios que entendesse convincentes – Livro V, CXXXIII). Era feito auto circunstanciado do tormento, ao qual só podiam comparecer o julgador, o escrivão e o ministro (este ministrava o tormento).
Segundo Pereira de Souza (citado por Cândido Mendes de Almeida, no comentário às ordenações – p.1315), eram consideradas penas vis a forca, as galés, o cortamento de membro, os açoites, a marca nas costas, o baraço e o pregão. As penas cominadas nas Ordenações Filipinas são as seguintes: açoite (em público; em público com baraço e pregão; com grinalda de cornos – no link, ver páginas 1257, 1249, 1190, 1149, 1148, 1191, 1313, 1278, 1298, 1162, 1279 e 1285; e LIVRO 5º, TÍT. XXVI, § 9º), atenazamento (apertava-se a carne do condenado, com tenaz ardente), baraço e pregão (baraço é o laço de apertar a garanta; pregão era a descrição da culpa e da pena), confisco de bens, decepamento de mãos ou corte de outros membros, degredo (para o Brasil, África, ou para o Couto de Castro-Mirim – a pena de degredo temporal era considerada leve, podendo o acusado se defender sem procurador); galés (remar em embarcações), morte atroz (com circunstâncias que agravam a morte, mas não o sofrimento: confisco de bens, queima ou esquartejamento do cadáver), morte civil (perda dos direitos e da graduação social); civil – perda dos direitos), morte com queima de cadáver após o estrangulamento, morte com queima do condenado vivo (a chamada "morte natural de fogo" ou "queima até virar pó"), morte cruel (tinha por fim tirar a vida lentamente, no meio de tormentos, para torná-la mais dolorosa – atenazamento, queima ou esquartejamento do condenado vivo, açoite até a morte, sepultamento do condenado vivo), morte na forca para sempre (deixar o cadáver apodrecer na forca), morte por degolação, com ou sem exposição da cabeça do réu, morte natural (por veneno, golpe, sufocação, decapitação), pagamento de custas processuais (não podendo pagar, o réu ficava quatro meses preso, sendo solto se não houvesse condenação ou cumprindo a pena dada além do pagamento das custas)e pena arbitrária.

A PENA DE PRISÃO E SUA ADOÇÃO NO BRASIL


O Código Criminal do Império do Brasil, de 1830, definiu 211 crimes, mas deve-se ressaltar que é difícil fazer uma contagem exata dos crimes e penas, porque são cominadas penas distintas para crime consumado e tentado, autoria e cumplicidade, reincidência, ausência ou presença de qualificadores, dolo e culpa, para o caso de haver e para o caso de não haver no lugar da condenação casa de correção em que possa ser cumprida a pena de prisão com ou sem trabalho.
Dos 211 crimes, 187 (88,62%) têm cominada pena de prisão, perda de emprego público, suspensão de emprego público, multa, ou, às vezes, duas ou mais destas penas cumuladas. E outros 24 crimes (11,37%) aos quais são cominadas penas de morte, galés, desterro ou degredo. Esta contagem de crimes e penas vale para os livres e libertos. Em se tratando de escravos, as penas são as mesmas dos livres e libertos em se tratando de punição com morte ou galés. Nos demais casos, há substituição por açoites (art. 60), em quantidade a ser fixada pelo Juiz.
Considerada a possibilidade de substituição da pena por açoites, os escravos podiam ser açoitados se praticassem 152 (72,03%) dos 211 crimes existentes no Código Criminal. Isto porque não podiam praticar os 44 crimes típicos de empregados públicos, já que a tais cargos não tinham acesso, visto serem considerados bens.
A introdução da pena de prisão, no Brasil, foi, no Império, apontada como causa do aumento da criminalidade, segundo Assis Toledo, no livro Princípios de Direito Penal, p. 59, mencionando Basileu Garcia.
As providências iniciais para construir a primeira penitenciária no Brasil datam de 1833. O projeto se baseava em prisões inglesas e a prisão teria 800 celas. Apesar de seu início oficial datar de 1850, as celas começaram a ser ocupadas em 1837, pelos escravos presos no calabouço do Castelo; em 1856 foram os detentos do Aljube e, em 1859, os condenados às galés e a prisão simples. Note-se que a prisão do Aljube já era tida como mal-cheirosa, com muita aglomeração de presos, enfim, um depósito de presos, como se diz hoje. A nova prisão, com 800 celas, não foi construída conforme o plano inicial e tinha vários problemas. Ali estavam presos, em dezembro de 1873, 92 homens brancos e 45 negros; 58 brasileiros e 79 estrangeiros; 72 tinham cometido crimes contra as pessoas e 65 contra a propriedade. Entre 1850 até dezembro de 1873, dentre 1265 presos, 260 morreram (conforme SALLA, Fernando. O RELATÓRIO DA COMISSÃO INSPETORA DA CASA DE CORREÇÃO DA CORTE, DE 1874, E A POLÍTICA PENITENCIÁRIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XX. Em Revista Brasileira de Ciências Criminais – São Paulo, IBCCRIM-RT, ano 9, nº 35, jul-set 2001, pp. 252-295).

A primeira penitenciária de Portugal também data do Século XIX e existe até hoje em Lisboa.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Inquérito Policial

O Inquérito Policial, com a conformação mais próxima da que hoje é conhecida, surge no Brasil em 1871 (Decreto nº 4.824). Sua definição aparece no art. 42 do Decreto 4.824, era atribuição da Polícia, mas as autoridades judiciárias poderiam nele interferir. Pouca coisa mudou, até hoje, na estrutura legal do Inquérito, que, basicamente, enfatiza a apuração do crime de homicídio.

Tortura

A palavra tortura já designa a antijuridicidade de seu significado. Tortura é o termo moderno para tormento. O tormento era um meio de prova, devidamente regulamentado nas Ordenações Filipinas.
Curiosamente, a palavra tortura é um novo significado para um nome antigo, mas usando uma palavra antiga. É que no Fuero Juzgo, o que era contrário ao Direito era torto. E isto está mais correto do que o termo atual "antijurídico". É que direito significa reto e o que não é reto, é torto.
Tortura, portanto, é o contrário de "direitura"; torturar é praticar o torto.

domingo, 23 de agosto de 2009

Macaco Velho

Macaco velho não põe a mão em cumbuca. Este ditado popular indica que os macacos aprendem com a experiência?

MP e Parecer

A nova lei do mandado de segurança (art. 12) deu a medida da importância ao parecer que alguns membros do Ministério Público elaboram nos processos: nenhuma. A lei define o parecer como mera opinião, que - se não for dada - faz com que o processo passe imediatamente à sentença, sem que isso cause qualquer nulidade.
Quem fez o projeto de lei tentou inovar, mas ficou com medo de investir contra a tradição. Ficou a impressão de que o projeto de lei e a lei tiveram o intuito de enticar com o Ministério Público.
O parecer é uma participação sem utilidade nos processos e fere a Constituição (art. 129, IX), que não deu atribuições de pareceristas aos membros do MP. Pelo contrário: a Carta de 1988 veda a consultoria e o parecer é ato típico de consultoria.
Na posse do PGR, o Presidente Lula disse que havia riscos de se criar entraves à atuação do MP. Mas para que criar entraves, tirando ou restringindo a atuação do MP? Basta aumentar-lhe atribuições inofensivas, como é o chamado "custos legis", ou a atribuição de "fiscal da lei". Afinal, nunca vi alguém do MP ser acusado de abuso por ter atuado contra um poderoso num parecer. Em regra (nunca vi exceções, mas devem existir para confirmar a regra), só são acusados de abuso aqueles membros do MP que tentam provocar a punição dos que se acostumaram a viver impunes.

sábado, 22 de agosto de 2009

Processo Eletrônico

Há tempos venho imaginando um logotipo para o processo eletrônico. Tenho dúvidas se deveria ser um português, com traje típico do Século XIV, manipulando um computador, ou uma vara branca com um monitor pendurado. Enfim, algo que simbolizasse toda a estrutura processual da idade média (nossa matriz portuguesa) e apenas instrumentalizada com máquinas modernas.
É que o processo eletrônico, apresentado como a quintessência da modernidade, não modificou o modo de conduzir uma ação na Justiça.
As audiências não chegaram na era da taquigrafia ou da estenografia. O Juiz dita e o Escrivão escreve, como nas Ordenações Filipinas ocorria com os Inquiridores e os Escrivães. Quando se vai além disso, as audiências são gravadas em áudio ou em vídeo e se gasta o dobro do tempo gasto quando eram ditadas: o tempo de realizar as audiências e o tempo de revê-las.
O tempo para analisar e julgar um processo eletrônico e um processo de papel ou é o mesmo ou a operacionalização do processo eletrônico gasta mais tempo que a do de papel.
Se o processo eletrônico tem muitos documentos, gasta-se um tempo enorme para abri-los (quando não cai a conexão com a internet).
O fato é que processo judicial é para resolver conflitos e seu resultado (friso: o resultado e não o processo) deve ter uma certa longevidade. Os meios eletrônicos de armazenamento de documentos ainda foram pouco avaliados e não se sabe se um documento gravado hoje em meio eletrônico, poderá ser acessado com qualidade daqui a vinte anos. Mas o papel é certo que se vai ver.
Talvez o ideal seja um sistema híbrido: fazendo documentos em meio eletrônico circular com a velocidade da internet, mas guardando cópias de segurança e originais no velho papel, num processo físico. E há casos em que se precisa do original em papel para comprovar e reprimir fraudes (num caso recente, o documento falso foi escaneado para o processo eletrônico; mas, como as regras de direitos humanos não permitem que se obrigue o falsário a entregar o original e, pois, fazer prova contra si mesmo (Pacto de S. Jose, art. 8, g), não há como levar a ação penal adiante). Aí, não é prudente ter tudo só no computador.
Enfim, nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Mas parece que se quer ir ao mar, só porque o mar é mais bonito. Ou dá mais holofote.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Queixar-se ao Bispo

A expressão "vá se queixar ao Bispo" já foi regra jurídica na Península Ibérica. No Fuero Juzgo ou Código Visigótico, uma legislação que vigorou na Espanha entre os anos 480 e 711, havia um dispositivo (Livro II, Título II, item XXVIII) que permitia que, quando as pessoas achassem que o Juiz julgara torto, recorressem ao Bispo.
Julgar torto significava julgar contra o Direito.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Epônimo de Gibraltar

Tariq ben Ziyad é o epônimo do Estreito de Gibraltar. Gibraltar é uma corruptela da expressão árabe Djebel el-Tariq, “A Montanha de Tariq”, até o ano de 711 chamada de “As colunas de Hércules". A invasão islâmica da Península Ibérica pelos muçulmanos, foi conduzida pelo governador Musa ben Nusayr, da província de Ifriquyia, ou Ifriqiyya, atual Tunísia, e por seu Lugar-Tenente Tariq.
Os muçulmanos ficaram na Península Ibérica até 1492, quando os Reis Fernando e Isabel tomaram Granada.
Até hoje há muitos vestígios dos muçulmanos na Península Ibérica, Al-Andalus. A capital de Al-Andalus era Córdoba, onde ainda está a grande mesquita.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Movimento de Manada

Fico impressionado com a ira antitabagista que atinge as pessoas. Aqui no Brasil, além disso, opiniões contrárias ao que está na moda não são aceitas. Quando estive nos EUA impressionou-me o fato de que, na frente de um protesto contra a Guerra do Iraque, havia um grupo se manifestando a favor da guerra. Aqui, isso seria considerado provocação e os dois grupos logo se engalfinhariam.
Quando entrei com a ação que procurava coibir os exageros da propaganda anti-tabagista, impressionou-me o horda que investiu contra a idéia.
O fumante me parece o Goldstein do momento. Volta e meia - como no 1984 de Orwell - desencadeiam-se os dois minutos de ódio contra cigarros e fumantes. Impressionou-me o momento em São Paulo, quando começa a vigorar a nova lei anti-fumo.
Se houvesse a mesma fúria repressora contra bebidas alcoólicas, barulho, furtos, roubos, corrupção, sonegação de impostos, com certeza estaríamos mais felizes.
Mas só os fumantes protagonizam os Dois Minutos de Ódio...

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Diploma de Jornalista

O STF declarou inconstitucional a exigência de diploma para o exercício do jornalismo. O fundamento era que o art. 4º, V, do DL 972/69 não foi recepcionado pela Constituição, por ferir a liberdade de imprensa e o direito à livre manifestação do pensamento, este previsto no Pacto de San Jose da Costa Rica.
Mas a exigência de exercício da Advocacia por Bacharéis em Direito (art. 8º, II da Lei nº 8.906/1994) também pode ser interpretada como desrespeito ao princípio da ampla defesa, previsto no art. 5º, LV da Constituição.
Não falo em exercício da Magistratura ou do Ministério Público, pois aqueles julgam e estes acusam. Mas, se precisarem se defender, a proibição de Juízes e Membros do MP exercerem a Advocacia está na própria Constituição.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Estado e Violência


Os 3 elementos do Estado são Povo, Território e Governo. É interessante a relação que a origem destas 3 palavras tem com a violência.

- Povo, por exemplo, vem do substantivo latino populus, que quer dizer "povo". Popularia são os lugares da plebe, popularis é popular ou compatriota, popularitas é esforço para agradar ao povo, populariter é ao modo do povo. Mas, curiosamente, o verbo populor significa devastar, assolar, destruir, aniquilar. Assim, populabilis é o que pode ser assolado; populabundus é assolador, devastador; populatio é assolação, devastação; populator é devassador, destruidor; populatrix é a que devasta.
- Por que "território" e não "terreno"? Porque "território" tem origem na palavra latina territorium (e não na palavra terrenum), estando relacionada, a palavra territorium, a territum, particípio passado do verbo terreo, que quer dizer "fazer tremer, aterrorizar, fazer fugir pelo terror, afugentar, repelir".
- Governo vem de guberno, que quer dizer governar, gerir, dirigir. E gubernum quer dizer leme, ou timão. Gubernatrix é aquele que governa e gubernator é aquele que dirige o leme, timoneiro.
- "Estado" vem de status, que significa maneira de estar de pé, postura, atitude, posição, posição, bom estado, situação, estabilidade.

Suicídio do Rei

– Dentre os povos Yorubá, havia os do reino de Oyo. Se o rei cometia um crime, dizia o Oyo-mesis (o bahorum): “As nossas sessões de adivinhações revelaram-nos que o seu destino é mau e que o seu orun (o seu outro ser celeste) já não tolera que continue aqui na Terra. Pedimos-lhe, pois, que vá dormir”. O soberano devia envenenar-se logo a seguir.

A narrativa consta do livro História da África Negra, de Joseph Ki-Zerbo. Como temos forte influência cultural da África, a insistência para que se peça licença ou renúncia (em vez da abertura de processos) pode ter aí sua origem.

domingo, 2 de agosto de 2009

Discussões Indiscutíveis

Há temas que eu não entendo como podem ser objeto de discussão. O do momento é o toque de recolher dos menores. Não sei o que leva uma pessoa a defender o direito de uma criança ou adolescente a varar madrugadas perambulando pelas ruas. O artigo 18 do ECA diz que é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. Ora, mesmo que o art. 16, I do ECA diga que crianças e adolescentes podem ir, vir e permanecer nos logradouros públicos, à noite todos os gatos são pardos. O risco de uma criança ou adolescente ser vítima de atos desumanos, de violências, de terror, vexame ou constrangimento é muito maior na noite do que no dia; e, mesmo no dia, andar sozinho pela rua é um risco para uma criança ou adolescente. Não vi em Nova Iorque, Lisboa, Madri e Paris crianças e adolescentes andando sozinhas pelas ruas, nem de dia, nem de noite. Será que não há crianças e adolescentes por lá?

Escândalos Escandalosos

Na minha profissão é coisa cotidiana descobrir gente fazendo falcatrua. Nem sempre uma falcatrua dessa vira escândalo. As causas de não virar escândalo são inúmeras, que vão desde as “do bem” (falta de interesse do público, ser o escandaloso um desconhecido etc) até as “do mal” (o escandaloso é um bom anunciante dos órgãos de imprensa, é bem visto por quem poderia alimentar o escândalo etc).
É curioso que, às vezes, gente de comportamento duvidoso, de há muito conhecida por tal comportamento, de repente vira escândalo. A pessoa sempre foi um escândalo, mas de repente seu escândalo fica escandaloso. O que leva um escandaloso de longa data virar um escândalo nacional?

sábado, 1 de agosto de 2009

Concurso

Passar em concurso requer estudo, disciplina, perseverança, escolha objetiva e muito pouco de sorte. Primeiro deve-se saber que concurso se quer e se se quer mesmo passar num e naquele concurso. Melhor é eleger um leque de concursos com um núcleo comum de disciplinas: Juiz Federal, Procurador da República, Procurador da Fazenda Nacional, Advogado da União e Delegado de Polícia Federal são concursos com um núcleo comum de matérias. Já Juiz de Direito, Promotor de Justiça e Delegado de Polícia Civil têm outro núcleo comum de matérias.

Concurso 1

Deve-se fazer mais de um concurso, especialmente porque muito raramente se é aprovado no primeiro. Há necessidade de ganhar uma certa experiência em concursos, do tipo procura de vagas, nível dos concorrentes (geralmente, num concurso de 10 mil candidatos, 500 são competitivos e os demais só fazem número), administração do tempo durante as provas e controle do nervosismo. Aliás, o nervosismo exagerado pode botar um concurso a perder.

Concurso 2

Mesmo que se faça uma boa escolha do grupo de concursos a serem prestados, mesmo que se aprenda a dominar o tempo e os nervos durante as provas, nada é mais fundamental do que o estudo e a disciplina para estudar. Sempre é bom lembrar que, enquanto se está fazendo festa, um outro concorrente está estudando. Não existe o tal livro mágico, que se lê e se passa no concurso desejado. Não há necessidade de uma obra muito profunda, mas ela precisa trazer todos os conceitos fundamentais. Se o membro da banca escreve livros, é indispensável ler seus livros, pois pode se tratar de alguém muito vaidoso e que queira que sua obra seja lida compulsoriamente.
O tempo de estudo deve ser rigoroso: se foi reservada uma hora por dia para estudar, esta uma hora integralmente dedicada ao estudo. Um bom método é marcar a hora no cronômetro e o cronômetro ser interrompido para o lanche, para o banheiro, para o telefone etc. Terminou o lanche, reativa o cronômetro.
Não há milagres nem sorte, só estudo e dedicação.

Dilação ou dilatação?

Geralmente vejo as pessoas se referirem à prorrogação de prazo como dilação. Está certo que dilação é mais bonito do que dilatação. Mas, apesar do Aurélio dizer que dilação é sinônimo de dilatação, na verdade não é, apenas o uso consagrou a mancada.
Em direito, a palavra dilação é sinônimo de prazo: dilação probatória, dilação peremptória etc, conforme já constava das Ordenações Filipinas.
Assim, para torrar a paciência de quem pede dilação de prazo e para ver se as pessoas se emendam, digo sempre que concordo com a dilatação da dilação.

Tramitando ou Pendente?

Aqui no Brasil se diz que um processo está tramitando. Tenho visto cartas rogatórias de outros países, dentre os quais a Alemanha, em que se fala que o processo está pendente.
Passei a achar que o termo "pendente" produz um efeito psicológico que faz o processo andar mais depressa; enquanto que "tramitando" faz o processo andar devagar. Vejamos: a palavra tramitando dá a impressão que a finalidade do processo é tramitar: tramita, tramita, tramita e nunca acaba; já a palavra pendente dá a idéia de que vai cair a qualquer momento, ou seja, logo vai ser resolvido.
Daí porque passei a me referir ao andamento dos processos como "pendente" e não "tramitando".