domingo, 18 de abril de 2010

Tiradentes 2


Acima, estátua de TIRADENTES na cidade de Ouro preto, antiga Vila Rica, Minas Gerais, Brasil.
Abaixo, final da Sentença que condenou Tiradentes à força (o texto completo da Sentença está no livro Tiradentes: a áspera estrada para a liberdade - TORRES, Luiz Wanderley., 3. ed. - São Paulo, Ateniense, 1991):
Sentença prolatada em 18 de abril de 1792:
PORTANTO, condenam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas, a que, com baraço e pregão, seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica onde, em o lugar mais público dela, será pregada em um poste alto, até que o tempo a consuma e o seu corpo será dividido em quatro quartos e pregados em postes, pelo caminho de Minas no sitio da Varginha e das Cebolas aonde o Réu teve as suas infames práticas, e os mais nos sítios de maiores povoações, até que o tempo também os consuma; declaram o Réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens aplicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo própria, será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados, e no mesmo chão se levantará um padrão, pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável Réu (...).”
As penas aplicadas a Tiradentes estavam previstas no Livro 5, Título 6 das Ordenações Filipinas. Havia algum arbítrio, mas, no geral, boa parte da pena estava prevista na lei. O item 9, do Título 6, previa que “o cometedor” seria condenado a morrer por morte natural cruelmente. Segundo nota de Cândido Mendes de ALMEIDA, cruelmente queria dizer com todo o cortejo das antigas execuções, o que dependia da ferocidade do executor, e capricho dos Juízes que neste ou em outros casos tinham arbítrio. Além da morte, o título 6 também previa como pena o confisco, para a Coroa do Reino, de todos os bens do condenado (o que já privava os descendentes da herança, no que era expresso o texto das Ordenações: posto que tenha filhos, ou outros alguns descendentes, ou ascendentes, havidos antes, ou depois de ter cometido, tal malefício). Antes seriam pagas as dívidas do condenado (item 20 do Título 6).
Curiosamente, ALMEIDA se limita a dizer que A casa do réu de ordinário era arrasada, e salgado o solo. Pode-se ver em Gratian. – "Forenses cap. 179 a razão desta prática”, sem nada noticiar a respeito do caso de Tiradentes, ocorrido em 1792. Se a obra de ALMEIDA é de 1870, o fato de não ter mencionado o caso de Tiradentes é um forte indicativo de que, como dizem outros autores (ver aqui Françoise Jean de Oliveira Souza), a Inconfidência Mineira não teve prestígio como ato de libertação do Brasil, no decorrer do século XIX.
A pena para o crime de Lesa Majestade de Primeira Cabeça ia além do condenado: os filhos homens eram excluídos da herança do pai, ficavam infamados para sempre, não poderiam receber honra de Cavalaria, nem outra dignidade, nem Ofício (hoje chamado cargo público); não podiam herdar de parente, nem de estranho com ou sem testamento; não poderiam receber coisa alguma que lhes fosse dada, ou deixada, assim entre vivos, como em última vontade. A pena ia até os netos do condenado. Mas as filhas podiam herdar (item 14 do Título 6).
As próprias Ordenações (Tit. 6, item 12), cogitavam do perdão aos criminosos, no casos da hipótese de crime de lesa majestade sob a forma de conselho e confederação, salvo em se tratando do cabeça da sublevação.
De qualquer modo, o Estado brasileiro vem indenizando, mediante pensões, os descendentes de Tiradentes (a Lei 9.255/96, por exemplo, concede pensão a Lúcia de Oliveira Menezes, tetraneta de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes; a Lei 7.705/1988 concede pensão especial a Jacira Braga de Oliveira, Rosa Braga e Belchior Beltrao Zica, trinetos de Tiradentes).

Um comentário:

  1. As penas cominadas nesse “Livro do Terror” (Livro V das Ordenações Filipinas)foram, ironicamente, comentadas por Frederico II, o Rei da Prúcia, no sec. XVIII, ao fazer a seguinte pergunta: “Mas ainda há alguém vivo por lá?".
    E como haveria Frederico II? Impossível seria sair ileso de uma condenação com base nas Ordenações Filipinas, apesar de existir nas mesmas a expressa hipótese de perdão aos criminosos no crime de Lesa-Majestade! Até mesmo os crimes mais simples eram apenados pela Sentença capital (com a morte), como por exemplo, o Roubo, a Falsificação de Moeda, o Falso Testemunho, a Feitiçaria e a Bigamia, em paralela igualdade com os crimes mais graves, como o homicídio e o estupro.
    Analisando essa Lei verifiquei que, de fato, o terror, o ódio e a crueldade predominavam no seio social àquela época. E o predomínio do "terror" durou muito tempo! O Livro V das Ordenações Filipinas (Libris Terribilis), que previa a parte penal, teve uma grande longevidade em nossas terras, quebrando recordes, eis que, vigorou por mais de 200 (duzentos) anos, chegando a se estender até 1830, quando da promulgação do Código Criminal do Império. Assustador!
    BEATRICEE KARLA LOPES

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