quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A Igualdade



A igualdade entre as pessoas é uma ficção social e a igualdade perante a lei é uma ficção jurídica. Sabemos que somos diferentes uns dos outros. Por isso há sociedades humanas igualitárias (EUA) e sociedades hierarquizadas (Brasil); há sociedades animais igualitárias (chimpanzés) e sociedades animais hierarquizadas (macacos).

Em geral, as normas de direitos humanos e as normas contemporâneas de direito positivo declaram que devemos nos comportar como se todos fôssemos iguais uns em relação aos outros. Direitos humanos se confundem com os direitos naturais (= direitos que se presume já existirem antes das pessoas). Assim, não importa que um Estado reconheça ou não o direito à vida, por exemplo, pois este direito já existiria antes do Estado. Direito positivo é aquele direito reconhecido pelo Estado, ou seja, que está nas leis de determinado Estado. Mas mesmo para que os Direitos Humanos tenham força obrigatória num país (num Estado) é necessário que este este país os reconheça.

Se a igualdade entre as pessoas é uma ficção, a mesma lei que a estipula procura compensar diferenças reais existentes entre as pessoas, dando mais direitos para umas do que para as outras. Assim, por exemplo, como supõe-se que pessoas com alguma deficiência física se tornem menos ágeis do que as que não têm deficiências, dá-se àquelas pessoas com deficiência alguns direitos a mais do que as não deficientes, para realizar a igualdade segundo na lei.

Mas a igualdade não se torna parte da vida das pessoas tão somente por estar nas leis. É necessário que ela seja assimilada e vivida. O quadro acima mostra uma das perguntas que fiz, em 1986, às pessoas que residiam no centro de Itajaí/SC (para ver o questionário completo, clique aqui). Pelas respostas, vê-se uma impressionante certeza de que é desigual o tratamento das pessoas perante a lei.

Mas é só a lei que trata as pessoas desigualmente?

Não. A igualdade precisa ser vivenciada. A igualdade é uma postura de pessoas em relação a pessoas. De nada adianta a lei declarar que todos são iguais, se as pessoas não vivem segundo a igualdade. E viver segundo a igualdade é respeitar o outro como pessoa: não furar filas, não querer levar vantagem em prejuízo do outro, não, enfim, ganhar as paradas na base da cotovelada em quem está ao seu lado.

Quando fui aos EUA, percebi que todos recebem os mesmos tratamento de todos. Não são só os representantes do Estado que tratam as pessoas igualmente. As pessoas se tratam com igualdade: o carregador de malas do hotel fala com o hópede de igual para igual; não precisa falar demonstrando uma atitude servil, como se, pelo fato de alguém carregar a mala de outrem, se tornasse inferior.

A pessoa que serve a outras pessoas, em lugares em que a igualdade é vivenciada e praticada mesmo fora das relações estatais, tem perfeita clareza de que é igual ao que é servido; e o que é servido, sabe que o que o serve está ali para desempenhar um trabalho digno e ganhar honestamente seu dinheiro.

Enfim, não é o Estado e a lei que vão impor a igualdade entre as pessoas. Se as pessoas se tratam desigualmente, toda a rede social e política irá assimilar esta desigualdade; ou, mesmo que a lei imponha a igualdade, as pessoas não irão cumprir esta lei. Tanto é que o quadro acima não reflete a legislação brasileira. Já na nossa primeira Constituição (1824) constava o famoso princípio:

Art. 179 (...):

XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.
Esta declaração de que todos são iguais perante a lei foi mantida, sem exceção, em todos os oito textos constitucionais brasileiros: 1891 (art. 72, § 2º), 1934 (art. 113, 1), 1937(art. 122, § 1º), 1946 (art. 141, § 1º), 1967 (art. 150, § 2º), Emenda Constitucional nº 1/1969 (art. 153, § 1º) e 1988 (art. 5º, caput).

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